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Fui ao Cinema... E não comi pipocas!

As aventuras e desventuras de uma miúda que se alimenta de histórias cinematográficas.

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#TBT: Adeus, Lenine! e os 30 anos da Queda do Muro de Berlim

15.11.19 | Maria Juana

Em 2003, o Muro de Berlim era apenas parte da História. Parte de um passado atribulado germânico, mas também do mundo, das inseguranças da Humanidade e da certeza de que, por muito errado que o presente seja, deve sempre existir esperança no futuro.

O Muro de Berlim simbolizou um passado de divisões e ausência de paz - não necessariamente guerra, mas um impasse no presente em que qualquer passo em falso e qualquer pequena palavra poderia ditar um destino. Foram tempos meio estranhos, sobretudo em Berlim; estamos a falar de uma cidade dividida em dois, em dois países totalmente diferentes e com regras diferentes. A queda do Muro foi símbolo de igualdade e paz. Mas já em 2003 era passado.

Mas sabemos que se há fonte de inspiração para a Arte é o passado e o seu significado. Não sei se foi essa a inspiração para Bernd Lichtenberg e Wolfgang Becker ao escrever o argumento de Adeus, Lenine! Para efeitos desta introdução, vamos dizer que sim e aproveitar a celebração dos 30 anos da Queda do muro de Berlim para recordar uma das pérolas do cinema europeu.

Adeus, Lenine! foi lançado em 2003 para falar de acontecimentos de 1990. 13 anos depois da noite que mudou a história de Berlim e da Alemanha, foi lançado um filme que conta tudo da perspetiva dos que assistiram sem nada poder fazer, dos que viveram entre a mudança, do que ganharam, do que perderam… E da história de amor entre um filho e a sua mãe.

É um conto tão antigo quanto o tempo, não é, este amor incondicional entre pais e filhos? Agora vamos passá-lo para 1990, antes da Queda. Uma família de mãe e dois filhos já adultos moram em Berlim, no lado na República Democrática Alemã. Ela, a mãe (Katrin Saß) é uma fervorosa apoiante do modelo socialista e abraçou a sociedade em que vivia, mas um acidente colocou-a em coma profundo durante 8 meses. Só que nesses 8 meses aconteceu o que todos hoje recordamos como a Queda do Muro, e a RDA desapareceu causando grande mudanças no sistema político, económico e social da Berlim oriental.

E agora, quando acorda, como é que Alex (Daniel Brühl) vai contar à mãe que tudo o que conhecia mudou para sempre, sobretudo quando o médico diz que não pode sofrer nenhum tipo de choque?

Fácil: não conta, e faz a sua vida dentro de casa como se o Muro nunca tivesse caído.

O que resulta é uma história cómica, claro, com um Daniel Brühl a mover mundos e fundos para gravar noticiários falsos, imprimir jornais antigos e encontrar produtos que deixaram de existir depois da integração com a Berlim Ocidental. Mas ao mesmo tempo, é um filme cândido, romântico e um pérola de delicadeza e simplicidade, numa coesão que o cinema alemão consegue trazer com grande facilidade.

Adeus, Lenine! torna-se no exemplo do povo, daqueles que do dia para a noite viram a sua vida mudar. Não deve ser nada fácil, pois não? Acordarmos um dia e vemos que o sistema e país em que sempre vivemos desapareceu e somos obrigados a abraçar uma cultura completamente diferente. Dito desta forma pode parecer algo dramático - todos sabemos que a RDA e Berlim Ocidental se cruzavam e não é como se os habitantes da Berlim Oriental não tivessem qualquer tipo de contacto com o outro lado. Ainda assim, é engraçado perceber como, apesar de tudo ser sido abraçado com relativa facilidade e rapidez, não seria natural existirem aqueles resistentes à mudança?

Este é quase o retrato do que mudou e como. Das marcas que deixaram de existir, dos canais de televisão que mudaram, da liberdade de andar nas ruas, dos jornais que mudaram o tipo de notícias, dos hábitos que foram mudando de forma tão subtil que já não nos lembramos como era o passado. Tudo para que um filho conseguisse proteger a mãe, uma mãe adormecida para a mudança e que sempre acreditou no seu mundo como controlado e certo - até ao dia em que deixou de o ser.

Celebrar a Queda do Muro com uma história de amor entre uma família que está a aprender uma nova realidade é bonito, mas é sobretudo bonito porque Adeus, Lenine! simboliza isso mesmo: um adeus. Não ao conforto, não há família, mas às divisões e desigualdades. Adeus, Lenine, mas olá a novo mundo.

Passados 30 anos, Berlim ainda parece uma cidade dividida pelo progresso. As mudanças demoram o seu tempo a acontecer. Ainda estamos a vivê-las…

 

Adeus, Lenine! regressou a salas selecionadas. Ainda devem ir a tempo!