Chama-me Pelo Teu Nome (2017): a beleza do primeiro amor
Sinopse: Elio (Timothée Chalamet) é um jovem de 17 anos que passa os seus verões na preguiça das paisagens do Norte de Itália em 1983. Na vila dos pais, passa os seus dias a ler, estudar música ou a nadar no rio. Até que chega Oliver (Armie Hammer), um estudante americano que vai ajudar o pai de Elio nas suas investigações arqueológicas. Entre eles nasce uma amizade que floresce para a descoberta do amor.
Quando comecei a ouvir falar sobre Chama-me Pelo Teu Nome fiquei com a ideia de que este era um filme de amor. Mas não uma história de amor convencional - antes uma em que aprendemos que não existem barreiras de género e sexo no amor. Depreendi que este fosse um filme para nos abrir a mente, e para nos fazer ver que o amor gay é tão belo e puro quanto o heterossexual.
Também havia elogios à beleza da realização e fotografia, à poesia dos planos, à intensidade da interpretação. E havia até quem dissesse que este argumento era dos melhores do ano - adaptado, pois baseia-se no romance com o mesmo nome de André Aciman.
Quando ontem sai da sala de cinema, tinha mil ideias a circular na cabeça, e nenhuma delas me ajudava a perceber se tinha gostado do filme ou não. Enquanto estava na sala, uma parte de mim apreciava, enquanto que a outra estava pronta para sair.
Não por o filme ser mau - longe disso. Antes porque afinal estava perante o que me parecia uma falsa promessa: para mim, Chama-me Pelo Teu Nome é um filme bonito e interessante, mas não o idealismo de amor de que estava à espera. É terrivelmente longo, e a preguiça de Elio contagia-se.
Será que estava a ser afetada pelo cansaço do dia, que não me deixava apreciar um filme deste género aquela hora? Talvez. Até porque, ao sair, e quanto mais pensava sobre o filme, mais achava que conseguia finalmente ver o que os outros viram.
Mas continuo a achar que não é suficiente para ser dos meus preferidos do ano.
Não me interpretem mal, continuo a achar um filme belo e interessante. Mas algo lhe falta.
Vamos por partes. Uma coisa é certa: não podemos negar que a interpretação dos dois protagonistas é intensa. Mais do que intensa, está repleta de química e de uma pureza, em que vemos no seu olhar e na forma como se tocam que existe paixão e, acima de tudo, urgência - urgência em se conhecerem, em se descobrirem, em se amarem.
E não é porque estamos a falar de dois heterossexuais que têm de se beijar (se bem que conseguem ter mais química do que muitos homens e mulheres por aí). Ator é ator, e tem de ser profissional. É mesmo a forma como a sua personalidade passa cá para fora, como vemos a inocência de Elio em Chalamet, ou o encanto e desencanto de Oliver em Hammer. Eu sempre fui grande fã de Hammer, por isso não me surpreende. Surpreende-me sim a maturidade com que Chalamet interpreta o seu Elio, e consegue transpirar todas as incertezas da sua personagem.
Depois temos as paisagens italianas. Não há um plano em que a cinematografia não seja precisa ou aproveitadora do calor e luz natural italiana. As cores e o ambiente são quentes como verão, preguiçosas como a vida de Elio - e ao mesmo tempo, cheias de esperança.
Há um ritmo muito próprio e intenso na forma como o filme está filmado e dirigido. Este é sem dúvida um verão lânguido e em que não há nada para fazer, e a música e ritmo do filme seguem essa ideia. Somos transportados para aquele verão de 1983, como se o vivessemos, e isso torna Chama-me Pelo Teu Nome um filme muito rico, e extremamente bem dirigido por Luca Guadagnino.
Só que falta-lhe o fator UAU que eu não encontrei.
Tudo emana beleza e pureza em Chama-me Pelo Teu Nome, desde as personagens à sua relação, ao ambiente que os envolve. Não há dúvida de que é um belo coming of age movie, em que vemos um jovem adolescente a debater-se sobre a sua identidade e gostos. Vemos a sua jornada, desde a descoberta de um prazer sexual, ao verdadeiro amor, tido como errado e proibido, mas que lhe dá a certeza de que é isto que ele quer para a sua vida.
Comparado com tantos outros filmes do género, está vários passos em frente por toda a técnica e poesia que emana, e toca-nos de uma forma especial por isso mesmo. Mas não deixa de ser, para mim, apenas mais um coming of age movie.
Talvez seja porque estou inserida numa realidade aberta, em que já assisti várias vezes ao caminho que Elio percorreu e o acho natural. Sim, eu sei que este é um filme de época, e que em 1983 não era fácil alguém chegar ao pé da sociedade e dizer “bitches, sou homem e gosto de homens. Deal with it!” Aliás, ainda não é fácil, e ainda não é permitido dizê-lo à boca cheia sem dois ou três olhares de lado.
Percebo que esta mensagem, de que é OK sentir amor quando todos os outros acham errado, é importante. Sei que é importante termos cada vez mais no cinema histórias que nos mostrem que o amor homossexual é tão puro e importante quando o heterossexual, e que não há mal nenhum. Temos de ter mais cenas de sexo naturais, tal como temos entre um homem e mulher, porque só assim é que transformamos mentalidades.
Mas terá Chama-me Pelo Teu Nome essa importância? Tratando as duas realidades (neste momento o sexo entre dois homens e entre um homem e uma mulher, que vemos de forma diferente) de forma diferente, queremos mostrar que ainda existe essa diferença, esse dualismo, para lutar contra ele, ou temos vergonha de o assumir?
Sobre este aspeto fiquei com mais dúvidas do que conclusões. Não percebi se a culpa seria de um argumento que não me mostra o seu foco, ou se foi de mim, que não tenho sensibilidade para o compreender (o que é perfeitamente possível, ninguém é perfeito).
Fica a nota para um monólogo extraordinário no final do filme, e que na minha opinião foi dos melhores momentos no cinema. Um discurso sincero e que, acredito, resuma muito daquilo que este filme significou para mim: sente, vive e desfruta das tuas sensações e emoções quando quiseres e com quem quiseres.
Um aplauso para Michael Stuhlbarg, o ator que interpreta o pai de Elio e que nos ensina, em três minutos, que três minutos podem fazer um filme.
***,5